Single Use: notas sobre a performance de Jody Sperling | LUCILA VILELA

Body: 

english

 

Quando Jody Sperling avança pela Broadway com seu traje de sacolas plásticas, um ruído se instaura. Na cidade vazia e amedrontada, essa figura afogada em sacolas se movimenta ocupando as ruas, as calçadas e os canteiros, passando pela natureza, deslocando-se entre águas e árvores, para depois retornar. O trajeto da performance de Sperling alude ao movimento dos plásticos que são arrastados para o ambiente natural sem controle.

A performance que deu origem ao vídeo Single Use (Uso Único), de 2020, traz a reflexão sobre a poluição ambiental, um dos maiores problemas que interferem na harmonia do planeta. Esse ser de plástico ambulante reflete a agonia de um mundo artificial.

Jody Sperling que domina a linguagem da bailarina Loïe Fuller, trabalho que realiza com a companhia Time Lapse Dance, provoca seus movimentos a partir da imensidão do traje. Assim como Loïe Fuller, Sperling é absorvida por seu figurino. E em muitos momentos seu corpo desaparece. Mas em vez do tecido branco de seda utilizado por Fuller no início do século 20, na performance de Sperling, seu corpo é envolvido por mais de cem sacolas plásticas.

No traje, uma espécie de parangolé se configura. Os parangolés era capas, estandartes, tecidos criados pelo artista Helio Oiticica nos anos 1970. Eles também perambularam pelas ruas de Nova York, compreendendo a interação e a relação corpórea com a obra de arte. 

Em Single use, uma alusão pode ocorrer com as vestes improvisadas dos moradores de rua, que carregam consigo os rastros da cidade. Acumulam tecidos, sacolas e objetos que arrastam junto com seus corpos. Um abrigo ambulante que se move na aridez urbana.

A poluição plástica e a frieza das cidades são evocadas na performance de Jody Sperling como um alerta. O isolamento social durante a pandemia no ano de 2020 provocou uma conscientização sobre a importância da natureza e da preservação ambiental para a própria sobrevivência. A pequena interrupção da intervenção humana, surtiu efeito na natureza que lentamente começou a se reconstituir.

A performance também é crítica em relação ao consumo e à cultura do descartável. Sperling inicia e termina seu trajeto diante de uma vitrine, em um momento de observação e consciência da indústria do consumo. A proliferação de sacolas e produtos descartáveis são contaminados pelo vazio existencial que patina nas ilusões provocadas por falsas imagens.